Social 04/04/2014 00:00
Os alunos acumulam um grande déficit na escuta. Em compensação, extrapolam todos os seus limites em outra perspectiva: falar. Os professores e professoras, por sua vez, numa sala de 20 a 30 alunos, enfrentam grande prejuízo que envolve a sua função na educação: escutar. Professores e professoras usam demasiadamente a única arma que ainda apresenta alguma eficácia: a sua voz. Esta, por sua vez, ecoa em gritos como último recurso para chamar atenção de seus conteúdos e manter a disposição dos alunos para propósitos de uma sala de aula.
Acredito nas perspectivas dialógicas da educação, mas confesso que pouco consigo fazer em um período semanal de 45 ou cinquenta minutos. Tenho experimentado, timidamente, conversar com alguns dos muitos alunos que tem frequentado nas minhas aulas. Esta conversa, no entanto, sempre precisa de alguma mediação de algum colega da escola. Geralmente converso com alunos nos intervalos chamados de “janelas” no ambiente escolar. Sinto a necessidade de conversar fora do calor das discussões e dos “nervos à flor da pele”. Nesta hora, o professor é quem convida o aluno a conversar, numa iniciativa propositiva e positiva.
Chegar junto ao aluno para escutá-lo é um grande aprendizado. Dizer a ele que você está aí para escutar, sem julgamentos nem imposições, revela-se maneira eficaz de construir vínculos. Processos educativos que não permitem vínculos reais entre os sujeitos aprendentes não tem valor significativo para ninguém. Muito provavelmente, a grande maioria de nossos alunos não tem em suas casas uma relação dialógica de convivência, por isso mesmo convidar para o diálogo lhes causa um grande estranhamento.
Existe uma grande riqueza nas práticas de convivência humana, mas nem sempre acreditamos o suficiente nisso para nos encorajar em atitudes. Como afirma Rubem Alves, todo mundo precisa mais de quem escuta do que quem fala bonito. A sensibilidade do autor refere ainda que os seus mais significativos aprendizados não foram ensinados através dos livros, mas “prestando atenção”. Infelizmente, nossas intervenções na vida, na convivência e nas relações interpessoais estão cada vez menos pautadas pelas vivências empíricas.
As experiências da escuta e da fala, quando significativas, revelam que devemos acreditar nos ricos processos desencadeados numa perspectiva dialógica do conhecimento. Observamos que dialogar com os alunos na perspectiva de ouvir as suas razões, sentimentos e incompreensões muda a percepção dos mesmos em relação a si, aos outros e com o mundo. Por isso mesmo, deveríamos ter a coragem e a ousadia de transformar nossas escolas em permanentes laboratórios de diálogo e de escuta, envolvendo diferentes tempos e lugares, com alunos, pais e professores. Separados ou misturados. A nossa persistência nesta tese nos levará, inevitavelmente, a seres humanos mais humanizados e equilibrados. Humanizar-se é o maior desafio humano!
Nei Alberto Pies, professor e ativista de direitos humanos.