Cultura 07/05/2014 00:00
O Brasil é um dos países da América Latina que se esforça para consolidar a democracia, sem fazer rupturas. Consolidar democracia sem rupturas é uma hipótese razoável para explicar a grande dificuldade que este mesmo país tem para enfrentar, definitivamente, o problema de concentração de renda. Conforme dados da ONU em 2011, considerando a desigualdade na distribuição da renda em 187 países, apenas outros sete países apresentam pior distribuição do que o Brasil: Colômbia, Bolívia, Honduras, África do Sul, Angola, Haiti e Comoros.
Neste país, nos últimos dez anos, surgiram novos sujeitos que se proclamam os “novos pagadores das contas e dos custos sociais”: a classe média. Ouço reiteradas queixas de donos de revenda de carros, médicos, profissionais liberais, donos de construtoras, vendedores de máquinas agrícolas e produtores rurais. Estes, como nunca, tiveram acrescidos incomparáveis lastros de renda, em função de um país que decidiu investir em setores que mantiveram os empregos e o desenvolvimento econômico, aquecidos.
Queixam-se estes que o governo lhes cobra contrapartidas como parte de sua responsabilidade social. Que o imposto de renda lhes toma os ganhos reais. Que os impostos são muito altos e incompatíveis com seus negócios. Mas a queixa mais comum é a de que os impostos pagos ao governo financiam os que não trabalham. Que os programas sociais só reproduzem o ciclo dos que não querem trabalhar. Não hesitam em chamá-los de vagabundos, preguiçosos, desvalidos, oportunistas.
Os verdadeiros oportunistas deste país são outros: os banqueiros, os políticos e empresas corruptas, os investidores das bolsas de valores. Estes últimos não geram nenhuma riqueza, porque riqueza sempre é trabalho.
Carros, saúde, imóveis, serviços, máquinas agrícolas e produtos da agricultura são bens e produtos que resultam de nossa inteligência, capacidade e trabalho. Estes, sim, geram parte importante de nossa riqueza.
Nosso país produz bem, mas não consegue incluir a todos pelo trabalho. Se não pelo trabalho, todos os brasileiros tem direito a alguma renda, que lhes garanta dignidade humana. Estes que trabalham, e produzem, não o fazem sem apoio governamental e nem sem políticas públicas que escolheram setores produtivos capazes de alavancar nossa economia. Se não o fazem sozinhos e isolados, não podem querer desfrutar egoisticamente dos seus resultados.
Como dizia Herbert de Souza, o Betinho, “a verdadeira democracia não tolera a existência de excluídos”. A riqueza que é produzida coletivamente precisa de muitas mãos, mentes e tecnologia para ser gerada. Mais justo também que seja dividida.